Quando se entrava no quarto, antes de mais nada reparava-se na parede da direita. Aquilo que tinha começado com o placard de cortiça tinha-se expandido pela parede, e eram bem visíveis as marcas das mudanças que tinham ocorrido nos passados 3 anos que antecederam aquele dia. Via-se um bocado de tudo, um bocado da sua vida, fotografias de amigos que já foram, desenhos de há muito tempo, bocados de banda desenhada, anúncios, fotografia da turma, o nome de alguém, o cartaz de um filme. Todas estas pequenas coisas foram-se acumulando ao longo da parede, que parecia ficar cada vez mais pequena para a imensidão de coisas que se iam acumulando e da necessidade crescente de as mostrar a todos aqueles que deixava ver a parede.
A pouco e pouco, a parede foi-se tornando insuficiente, e começou o ciclo normal das coisas: tirar umas coisas para pôr outras, as mudanças normais que fizeram com que a parede ficasse despida, com uns espaços em branco que já ninguém conhecia. Depressa esses espaços foram preenchidos com outras coisas, decerto mais importantes, que aos 13 anos não ligava e aos 14 já lhe pareciam fulcrais.
Mas naquele dia, qualquer coisa lhe parecia estranhamente errada. A parede já não lhe dizia nada... A parede, que outrora fora a parte que mais gostava, aquela parte para a qual olhava durante horas a fio, parecia-lhe desinteressante. Já a conhecia mais que bem, mas não sentia que lhe fizesse tanta falta como antes, a parede, que tinha sido o sítio mais importante e de que mais gostava do seu quarto, já não o era, e isso não fazia sentido. A algum custo e talvez com lágrimas nos olhos (porque era uma parte da sua vida que ficava agora definitivamente para trás), começou a arrancar tudo por uma ponta e a partir daí tornou-se menos difícil. Quando acabou, ganhou coragem e olhou.
A parede estava branca... Absolutamente branca, mais do que se lembrava. Sentou-se no chão a olhar para ela. Não tinha nada, excepto uma frase que se tinha esquecido de tirar.
"Gosto das coisas de que tenho saudades. Esqueço-me das coisas de que não gosto."
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