Tuesday, July 19, 2005

"... and I miss you." (Parte 2)

Um mês passou, dois, três meses. Agora a menina estava sentada na varanda, naquela mesma varanda onde tantas outras vezes pensara no menino. Já tinham passado cinco meses, e nada parecia indicar que as coisas pudessem vir a mudar para melhor do que naquele dia em que ela o deixou apenas com um papel, apesar de ter sentido que devia ter parado e voltado para trás. Não sabia bem o que é que a tinha impedido de o fazer, apesar de sentir que o menino tinha ficado a vê-la desaparecer depois de ler o papel que ela tinha deixado caír e que só notou a falta em casa. Fosse o que fosse, foi essa mesma coisa que a impediu de lhe dizer fosse o que fosse nos meses que se seguiram. Pelo menos alguma coisa simpática, ou pelo menos alguma conversa normal como aquelas que tinham antes. Deu por si a amaldiçoar aquele dia, aquele estúpido dia em que se tinha apercebido que gostava dele. Afinal, antes disso estava tudo bem.
Suspirou fundo, tal como já tinha feito pelo menos uma dúzia de vezes só naquele dia. Isto tinha que acabar, tinha que deixar de se pôr a pensar nessas coisas que só lhe faziam mal e uma vozinha simpática na sua cabeça dizia-lhe que era o melhor a fazer mesmo. Decidindo acreditar nisso, sorriu, fechou os olhos e deixou-se ficar ao sol a ouvir música, concentrando-se única e exclusivamente nela.
Não muito longe dali, apenas o espaço suficiente para duas pessoas se verem todos os dias ou nunca se chegarem a encontrar, alguém está a chegar a casa. Olha para o relógio, 9 da manhã, nada mal, pode ser que não reparem. O sono é mais que muito enquanto chama o elevador no qual quase adormece, e quando finalmente chega ao seu andar e põe a chave na porta e entra em casa, atira-se para cima da cama. 'Vou dormir até amanhã' pensa ele. Descalça-se, atira com os sapatos quando de repente vê um papel no chão, que não reconhece imediatamente. Pensou em deixá-lo ali e ver depois, mas a curiosidade foi mais forte e não resistiu. Pegou no papel, leu-o e de imediato sentiu um nó no estômago.
Oh, ele conhecia aquele papel. Não sabia era que ainda o tinha... Claro que sabia, tinha-o guardado e olhado para ele vezes e vezes sem conta. Precisava de tempo para digerir aquela pequena mas essencial informação que lhe tinha acidentalmente caído aos pés e da qual ele sabia a fonte. Só tinha precisado de um bocadinho de tempo para pensar no que havia de fazer com ela... quando a menina começou a ficar estranha. Sim, foi mais ou menos ao mesmo tempo. Ele não percebia porquê, afinal quem é que as percebe?, só que estranhou mais que muito. A menina que sempre lhe parecera fantástica de um momento para o outro ficou estranha, embirrenta, amuada por tudo e por nada, respondia mal a qualquer coisa que ele dissesse, mal lhe falava e irritava-se quando ele não lhe falava a ela, mandava bocas parvas, tentava fingir que estava sempre tudo bem ou simplesmente deixava que toda a gente soubesse que ela estava na fossa. Basicamente, segundo o que o menino pensava, estava estúpida. E isso tinha bastado para que ele esquecesse aquele papel, para que ele não quisesse sequer voltar a pensar naquele assunto e por muito que lhe tivesse custado na altura, seguisse em frente. Só que pelos vistos ainda não tinha deitado fora o papel...
O programa era o do costume. Praia, compras, umas voltas aqui e ali só para desanuviar porque ela também precisava disso. Não que a menina ainda estivesse MUITO afectada com aquela história toda, porque não estava. Ela esquecia o menino quando quisesse, estava perfeitamente certa. Mas se ele tinha lido a porcaria do papel porque é que não tinha falado com ela? Sim, porque ela sabia que era o menino que o tinha, quem mais podia ter tido? Se calhar não tinha, se calhar tinha-o deixado caír no autocarro ou assim e outra pessoa tinha apanhado. Mesmo assim, a menina tinha um feeling que era ele que o tinha apanhado e que ele sabia. De repente uma ideia passou-lhe pela cabeça. E se o menino já tivesse tomado a decisão naquele dia em que eles falaram e não lhe tivesse dito logo só para ela não se magoar? Esta ideia irritou-a. Magoas-te quando cais, não quando te dizem o que não queres ouvir. Talvez tivesse sido melhor tudo de uma vez sem avisos, e ela já lhe tinha demonstrado que não queria mais saber. Em retrospectiva, talvez tivesse dito umas coisas que não queria, mas o que está feito está feito e agora não há nada a fazer. Aquela mesma coisa que a impediu de voltar atrás dizia-lhe o que fazer desde aí e ela cumpria à risca.
O menino também precisava de saír. Desta vez sozinho, não queria aturar ninguém. E além disso já tinha programa à noite. Não queria voltar a pensar naquele estúpido papel, naquela estupidez e perda de tempo que tinha sido aquela menina que não passava de uma pita e que o tinha andado a fazer de parvo. Se ela pensava realmente tudo aquilo que dizia, porque é que nunca o tinha dito antes? Poupava imenso tempo e trabalho. E pensar que ele tinha considerado sequer a hipótese de... enfim, já não interessava. Mais uma vez perguntou-se porque seria que não deitava o papel fora de uma vez por todas. Aquilo era só mais uma mentira, não era?
Ao voltar para casa, agora a pé, a menina lamentou ter pensado no menino todo o dia. Agora estava preocupada se os seus amigos não iam pensar que ela estava efectivamente a ficar tontinha, já que parecia estar sempre no mundo da lua e que já não lhe interessava nada. Mas eles, compreensivos como sempre, sorriam, ouviam as mesmas histórias mais de mil vezes e mesmo assim tinham paciência para ouvir mais umas mil. Estava agora a passar por uma rua onde costumavam passar muitas vezes e sentiu-se subitamente triste. Porque apesar de a menina saber que para ele ela tinha sido 'só mais uma', qualquer coisa que simplesmente não deu certo e vamos seguir em frente, ela continuava a gostar dele. E todas as coisas que a menina tinha dito e feito, todas as vezes que tinha parecido estúpida e dito coisas que na verdade não sentia, foi para se convencer do contrário. Não valeu a pena.
Passando por uma rua onde iam muitas vezes, o menino começou a pensar na menina outra vez. E se fosse verdade o que dizia o papel? Bem, se fosse, temos pena, mas era tarde demais. Ela não podia simplesmente esperar que ele estivesse sempre ali para o que lhe apetecesse não era? Quando estivesse bem disposta, tudo bem, quando estivesse mal disposta ele que se afastasse, as coisas não eram assim. Mas a verdade é que por muitas vezes que ele tivesse tentado fazê-la saír da sua cabeça, e por muitas vezes que tivesse conseguido, ela estava lá sempre por boas ou más razões.
Cada um estava tão completamente perdido nos seus próprios pensamentos que não se apercebeu de quem ia exactamente à sua frente num sentido contrário. Ambos chocaram com outra pessoa, e quando levantaram os olhos para pedir desculpa pelo encontrão é que viram que tinham chocado um com o outro. E ficaram assim, sem nada para dizer um ao outro.
Ou talvez coisas demais.

sigh...

1 comment:

Anonymous said...

E o que dizia o papel?