Thursday, November 11, 2004

A princesa deitou-se com os olhos inchados, e apesar de ja estar calma as palavras continuavam a ressoar na sua cabeça. Isto não devia acontecer nos contos de fadas! O que é feito afinal de tudo aquilo que lhe diziam? Daquela sensação que, por muito más que estivessem as coisas, tudo se resolveria? Agora não sabia... Também não sabia se alguma vez voltaria a saber, e a descobrir o mundo em que vivia até há tão pouco tempo... Aquele mundo que nunca apreciou devidamente, aquele mundo que estava prestes a esvaír-se como a areia da praia por entre os dedos.
Lembrou-se quando era pequena e ia à praia. De brincar com as bonecas. Daquelas histórias que acabavam sempre bem. Do desejo de "sonhos cor de rosa" antes de dormir. Dos amigos que eram sempre para sempre, mesmo que não fossem. De sentir que a vida está toda à nossa frente e não sabermos muito bem o que ela é, nem o que ela tem guardado para nós. De fazer desenhos. De serem todos felizes... muito felizes mesmo.
Pois bem, ela já não era pequena. Ia à praia, mas já não com a intenção de brincar com a areia. Já não brincava com bonecas. Sabia agora, que as histórias não acabavam sempre bem. Já não havia ninguém que lhe desejasse "sonhos cor de rosa" antes de dormir. Sabia que alguns amigos são para sempre, mas não são todos. E há uns que até nem o são, nem nunca o foram. Ou talvez tenham sido, à maneira deles. Já não sentia que tinha a vida toda à sua frente. Sabia o que era a vida, mas continuava sem saber o que ela tinha guardado para ela, e isso já não a fascinava... simplesmente tinha-o tomado como certo. Ainda desenhava. Ainda oferecia os seus desenhos, mas já não eram os mesmos. Continuavam todos felizes... mas ela sentia que já não pertencia a essa felicidade.
Fechou os olhos. Teve assim uma réstia de esperança de adormecer logo, de acordar e estar tudo bem, de voltar ao passado... De mudar as suas escolhas e de mudar assim tamém o seu destino. Talvez se o pudesse fazer neste momento não estivesse a pensar nestas coisas... Talvez estivesse a ouvir a sua música preferida, talvez se estivesse a rir de uma coisa qualquer sem sentido, talvez...não sabia.
Abriu os olhos e olhou à sua volta. Não viu nada, e não quis ligar a luz para ver que tudo estava no lugar, que nada tinha acontecido. Depois indignou-se... Afinal vivia num conto de fadas! Viveria? Essa certeza que a acompanhara toda a vida já não parecia tão certa, e só o simples facto de se questionar com isso entristeceu-a. Respirou fundo. A vida é mesmo assim, cheia destas coisas que não entendemos! Tanto podemos sentir que é a melhor coisa que nos aconteceu como também podemos achar que já nada faz sentido... Tinha que alterar isso. Tinha que arranjar um sentido. Mesmo que não o percebesse. Fechou novamente os olhos. Pensou que se adormecesse poderia ter sonhos que não fossem cor de rosa. E subitamente isso já não lhe pareceu tão terrível assim.

1 comment:

Anonymous said...

pois é Ana, esta é a realidade...